31 outubro 2010

As Bruxas estão soltas e os livros permitidos

Comecei a ler com 5 anos. Meu irmão mais velho e por parte de pai quem me ensinou. Lembro de mim, no banco de trás do carro ensaiando: "Car los An tonio Frei tas, den tis ta". E foi a partir daí que minha mãe teve a brilhante idéia de entrar para o Círculo do Livro. Alguém de Porto Alegre lembra disso?

Só sei que todo mês minha mãe recebia o representante desse clube e comprava uma meia dúzia de livros pra mim: A dama e o vagabundo; Marcelo, Marmelo, Martelo; A Bela Adormecida, Cinderela e mais um monte de títulos infantis conhecidos da infância anos 80.

Posso dizer que minha mãe pensou: não preciso mais inventar histórias para essa criança dormir. E não precisava mesmo. Agora era só ler. E ai dela que inventasse uma história mais curta, porque eu lia aqueles livros de cabo a rabo. Esnobava. Dizia que era muito fácil.
Foi quando ganhei a coleção inteira do Monteiro Lobato: O sítio do picapau amarelo. Livros sem figuras. Histórias profundas. Sutilezas, ironias. Tive que ler. Foi bem difícil. E só mais tarde fui entender do que se tratava aquele pó de pirilimpimpim...

Saquei que muito disso acontece ainda hoje. Muitos clássicos da literatura que li e na hora não caiu a ficha, mais tarde pensava: "ah, então era isso". Nenhum clássico é clássico por acaso. Dentro da obra de Oscar Wilde, por exemplo, existem inúmeros significados capazes de produzir infinitos insights, ainda que retardatários.

Não foi minha mãe que me ensinou a ler. Mas foi ela que me proporcionou o gosto pela leitura. Não que ela fosse rodeada de livros. Essa era uma das qualidades do meu pai. Minha mãe admirava tanto isso nele que quis passar pra mim algo que a ela não pertencia.
Se hoje eu tenho um maior conhecimento do mundo e enxergo ele com outros olhos, devo muito a minha mãe. 
Nenhuma viagem, por terra ou por droga, tem total sentido para quem não tem referências da literatura. 


O cinema, a arte e as grandes ideias, tiveram sua origem nos livros.
As mulheres que foram queimadas junto com as obras que liam, não faziam bruxarias, se apoderavam de uma sabedoria exclusiva dos homens. Agora, não tem mais jeito, eu sou bruxa desde os 5 anos. E adoro.